Uma das estampas de maior sucesso da branco ganhou uma nova versão: [FLORES IMAGINÁRIAS MINI], de Pat Lobo, artista parceira, recebeu um novo olhar - com uma deliciosa mudança na sua paleta de cores e uma escala menor. Criada a partir de tinta e pincel, a estampa pode remeter a muitas coisas: a infância, ao cheiro de um jardim florido, às memórias que já vivemos e tudo aquilo que ainda queremos viver. Mas o que a própria artista tem a dizer sobre a sua criação - e o processo criativo, e tudo o que passamos em 2020? Pat Lobo esteve muito em casa durante 2020 - e percebeu como isso se integrou ao seu trabalho. Da comida que fazia até a planta que regava e o desenho que precisava terminar: tudo entrava em um grande processo de fluência - e a fez entrar em contato com muitas coisas novas. João Vitor Lage conversou com Pat sobre tudo isso - e muito mais. Confira o papo, na íntegra, abaixo - e transforme seu branco com as flores imaginárias de Pat Lobo.
Como que é, para você, o encontro com as cores? De onde isso parte?
Eu acho que eu tenho uma tendência, apesar de ser brasileira e viver nesse país que é muito solar, de um olhar que me faz sentir falta de respiro, de pausa. Geralmente a minha paleta não é tão vibrante. Acho que tenho mais facilidade de transitar por essas cores, mas também gosto do vibrante. Inclusive, nesse trabalho que fiz, moram tons rosados e meio ocres, cinzas… Tem sempre um verde acinzentado que eu gosto. Acho que você adquire um repertório olhando muito para a natureza e todas suas riquezas.
Tem alguma sensação que você tenta passar, quando vê essas combinações de cores? Eu acho que é uma coisa que me agrada olhar, sabe?
Dependendo do trabalho é preciso trabalhar com uma ou outra paleta, mas no caso desse trabalho eu imaginei que isso fosse ficar na casa das pessoas - e o padrão já é algo que às vezes cansa um pouco. Minha primeira tentativa foi buscar uma paleta mais rebaixada.
E as flores imaginárias?
Elas vieram porque, bom, a gente tinha que pensar em um nome na coleção e, conversando com o Rafael (diretor da marca), falei que não tinha buscado nenhum livro de flor. Disse que elas faziam parte do meu imaginário - a gente constrói um repertório ao longo da vida -. E na hora de fazer eu agreguei formas de uma flor com outra, de uma planta, certas tonalidades… E acho que essa coisa do repertório vem muito da minha infância. Tive uma avó materna que tinha um sítio e, sempre que chegávamos lá, a primeira coisa que ela fazia era criar arranjos de flor para a casa, para trazer mais vida ao lar. E eu sou a neta mais velha, então ela ia no jardim e eu ficava ao lado dela, segurando as plantas e flores, observando a manufatura dos arranjos. Vem muito daí esse meu amor pelas flores e começar a gostar, querer saber nomes.
Essas flores imaginárias exibem esse seu jardim imaginário, não é? Seria uma referência à sua infância?
Acho que sim. A gente vai ali na memória da infância, que guarda muita coisa importante. Com certeza é daí que vem esse meu amor por formas orgânicas, por essa coisa de compor cores e tamanhos das flores. Foi meio que observando e interagindo com esses elementos. São tão lindos mesmo, não é? Tem tanta coisa incrível que a gente nem consegue chegar perto na hora de reproduzir - mas a gente tenta um pouco.
O que representa a casa para você?
Casa, pra mim, é um espaço que eu gosto de ter coisas queridas por perto. Ter o meu jeito, ter trabalho de amigos, coisas que a gente faz com a mão e que trazem uma referência do tempo, da memória. Eu acho que a casa é esse refúgio. A gente nunca mais vai olhar a casa do mesmo jeito. É um sentimento que está em mudança, e a gente reviu muita coisa que não tava legal. Ontem mesmo eu estava conversando com a minha filha sobre como foi bom para ela, para mim e para meu marido a nossa proximidade, que aumentou. Eu revitalizei alguns espaços em casa, refiz a minha horta, ampliei esses espaços verdes. Foi muito bom poder ver as coisas brotando e ter um tempo para observar como o feijão que eu como cresce. Como as ervas e coisas que a gente coloca na comida dão flor, sabe? A gente não vivencia isso: compramos as coisas prontas. Acho que teve essa coisa de revitalizar os espaços que estavam, digamos, empoeirados. Isso se deu na casa e na gente também - e a gente estava precisando muito repensar uma série de coisas.
Você acha que essa poeira que a gente vai tirar acontece tanto na casa quanto na gente, né? E você acha que isso tem a ver com estarmos mais dispostos a habitar esse espaço?
Sim. Para quem conseguiu e quem pode habitar esse espaço interno e se colocar - porque nem todo mundo teve essa escuta e possibilidade. Percebi que o meu tempo não é o tempo que eu estava vivendo a coisa da produtividade e da correria. Tanto que, no início, foi muito difícil e teve toda uma adaptação, o medo da doença, mas assim que a gente conseguiu minimamente se organizar, tudo começou a aparecer e fluir mais. Acho que a gente vai se adaptando e lidando com essas crises de uma forma - ainda que tudo seja tão complicado - mais positiva. Ainda é algo em andamento, mas é isso.
O que você te move?
Tem duas coisas que eu tenho buscado: uma é a construção interna. Que meu trabalho sirva para que eu me transforme numa pessoa melhor. Fazer uma estampa, um trabalho, sempre pediu que eu aprofundasse as coisas para encontrar significado. Dedicar tempo a um trabalho tem um sentido melhor - então eu penso em quem vai comprar, na história a ser contada. Tem um espaço de construção interna que é importante. E a outra coisa que busco bastante - e ainda não encontrei totalmente - é o coletivo. Sabendo que sou essa pessoa muito privilegiada, que conseguiu continuar trabalhando em meio a uma pandemia. Como eu posso retribuir? Como posso me conectar com outras pessoas? Que lugares são esses que posso estar junto de outras pessoas? A gente não tem mais como escapar dessa responsabilidade. Não dá mais para ficar só isolado em nossos mundinhos, com tudo o que está acontecendo. São essas as coisas que me estimulam a trabalhar e a pensar sobre o que eu faço.
Como é, para você, essa coisa de compor? Os caminhos de pensar nas flores, de criar. Como é sua aproximação com essa arte?
Eu estava aqui desenhando e pensando enquanto conversava, e é isso: é como compor um desenho. Você não sabe como ele vai ficar. Você pega as cores quase intuitivamente, e de repente algo que parece não combinar fica super bonito junto, se potencializa. É assim que eu penso em buscar essas parcerias: tentando criar esse tecido de pessoas diferentes, mas que possam trazer o que cada um tem de melhor, e conceber algo bom - e juntos.
A sua coleção também se ampliou - com cores mais vibrantes. O que você sente com essas cores? Como foi esse processo?
Quando eu fiz a primeira versão, de uma paleta mais fechada e com tons mais pastéis e escuros, tinha a ideia de que a gente poderia fazer uma paleta totalmente diferente, eventualmente, com tons mais vivos. Eu fui experimentando e achei que ficou bacana - alguns desenhos se mantiveram no tom anterior, mas ele combinou bem e ficou bem harmônico com as cores novas e mais vivas. Acho que deu certo! (risos)
Como é o processo de criar com materiais diferentes?
Eu acho que foi um processo bem natural: eu sempre desenhei com pilot, canetinha, lápis. Sempre desenhei desde pequena, mas de um jeito bem acessível e que eu poderia desenhar em qualquer lugar. Aos poucos, porém, você vai se apropriando dos materiais - e quer experimentar cada vez mais as coisas. O pincel foi muito natural, porque eu sempre gostei muito de pintura - o meu primeiro contato com a arte foi assim, com pintores tradicionais e modernos. Quis experimentar e comecei a gostar! Tem essa coisa da fluidez, da matéria, da tinta - se você trabalha com mais água a aquarela responde de outra forma, com tinta acrílica e guache é diferente, com outra espessura. Isso virou uma ferramenta de trabalho. Eu gosto de misturar diferentes tipos de material - o lápis com colagem, com guache; aquarela com tinta acrílica, pra ver como fica. Nunca tive muito pudor na hora de usar esses materiais. O pincel me ampliou o espectro de possibilidades. Tem a coisa do pincel, mas também tem a costura. Eu tenho explorado o desenho das sementes e também tenho trabalhado com tecido, sabe? Com tricô - e aí vem a textura, o desenho… É muito gostoso: às vezes estou fazendo um desenho que não está rendendo e começo a costurar. E no meio da costura eu mexo em algo, volto pro desenho, e aí rola! Eu acho que esse trânsito entre diferentes meios só torna o processo mais gostoso. Acho que essa curiosidade leva a gente a experimentar um monte de coisas.
Tem alguma música que você tem escutado muito? Isso faz parte do seu processo criativo?
Eu já fui muito ligada a música - muito mesmo! Sinto que meus filhos me apresentam as novidades, mas sempre foi super importante para mim. Hoje em dia gosto de ouvir músicas mais tranquilas - e aqui em casa até tiram sarro de mim, dizendo que é música para dormir. Mas eu gosto muito do silêncio, dos barulhinhos da casa. Não tem uma música específica - geralmente são canções mais calmas.
E em quais livros você busca inspiração?
Eu tenho uma coisa bem antiga com livros - porque eu sempre adorei ler, e um dos lugares onde eu me sentia mais confortável, quando morava no Rio de Janeiro, era dentro de uma livraria. Ficava lá folheando, olhando e hoje em dia, cada vez mais, existem livros além de tudo bonitos. Comecei a comprar livros artísticos quando ia em exposições e gostava muito - e passei a querer conversar mais com essas pessoas. [Os dois livros que Pat nos mostrou e indicou são 1+1+1, de Julio Villani, e Destruição do Pai Reconstrução do Pai, de Louise Bourgeois].
Agora que você já conhece mais sobre a sensibilidade, delicadeza e o que move Pat Lobo, que tal mergulhar na sua coleção e transformar seu branco?